A evolução dos códigos de conduta

Introdução Consideramos os códigos de conduta como uma “ponte” entre a Ética e as empresas.  Para justificar nossa posição, vamos partir da ideia de que as empresas podem ser vistas sob 3 ângulos: 1 – o perfil corporativo 2 – a identidade organizacional 3 – a cultura corporativa.          O primeiro – perfil corporativo – é uma espécie de retrato de corpo inteiro,
A evolução dos códigos de conduta



Introdução

Consideramos os códigos de conduta como uma “ponte” entre a Ética e as empresas.  Para justificar nossa posição, vamos partir da ideia de que as empresas podem ser vistas sob 3 ângulos:

1 – o perfil corporativo

2 – a identidade organizacional

3 – a cultura corporativa.

        

O primeiro – perfil corporativo – é uma espécie de retrato de corpo inteiro, apresentando dados relativos à fundação, objeto social, controle acionário, número de funcionários, filiais no país e no exterior, posição nos mercados em que atúa, número de clientes, principais indicadores operacionais e econômico-financeiros etc.;

O segundo – identidade organizacional – está espelhado na Declaração de “Missão, Visão e Valores”, cuja estrutura básica deve ser uma exposição bastante objetiva e concisa dos seguintes pontos:

Missão – maneira pela qual a atividade da empresa ou organização está contribuindo para melhoria da qualidade de vida da sociedade;

Visão –  síntese do planejamento estratégico, ou seja, aonde a empresa quer chegar;

Valores – fatores que permitem à organização  alcançar sua visão e cumprir sua missão.   Não se cuida, aqui, de princípios éticos, como integridade, transparência, responsabilidade social etc., que se referem à “cultura”,  mas dos “fortes” da organização, como tradição no mercado, força da marca,  qualidade dos produtos, rede de distribuição, motivação do pessoal, desenvolvimento tecnológico, bom atendimento aos clientes e assim por diante.

        

O terceiro ângulo – cultura corporativa – tem tudo a ver com Ética, porque envolve, basicamente, o nível de confiança, de respeito e solidariedade que permeia as relações internas e externas da organização e se traduz nas melhores práticas de governança corporativa orientadas pelos princípios de transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade socioambiental.                                                                    

O instrumento adequado para disseminar uma “cultura ética” na organização é o Código de Conduta, como registramos na abertura deste texto.  Não o rotulamos de “Código de Ética” porque Ética é a inspiração dos códigos, que são conjuntos de normas de comportamento.  Algo parecido com um hipotético  “Código de Direito” ou  um  “Código de Justiça”:  o que temos são códigos de deveres inspiradospelo Direito e pela Justiça, como o Código Penal, o Código Civil, o Código de Defesa do  Consumidor e muitos outros.  Além disso, é importante que não se misturem “valores” com “princípios éticos”: os primeiros fazem parte da identidade organizacional,  enquanto os segundos se integram à cultura ética.

Embora atualmente em enorme evidência, em grande parte promovida pelo fortalecimento das práticas anticorrupção, os Códigos de Conduta são nossos velhos conhecidos e têm uma longa história a ser contada em milênios, séculos e décadas.  Vamos tentar resumi-la no infográfico postado.

Códigos em retrospecto

Os infográficos precedentes cobrem um período de 5.000 anos, durante o qual diferentes povos, em diferentes épocas, mostraram sua preocupação com o estabelecimento de normas de conduta que evidenciassem o contínuo progresso da humanidade em direção a um relacionamento entre pessoas e povos orientado por confiança, respeito, solidariedade, transparência e equidade.  Nessa caminhada, o conceito de “elite” – tradicionalmente aplicado às elites de qualquer natureza (dinastias, poder militar, religiosas e, mais recentemente, econômicas) – foi se reconfigurando, para dar lugar à verdadeira “elite”, desta vez formada por todas as pessoas de bem, em qualquer classe social, que são a impressionante maioria.  Este processo foi alimentado pela globalização da informação que, finalmente e pela primeira vez na história da civilização, converteu o mundo em uma comunidade global, em que propostas como “interesses coletivos” e “prioridade para o social” encontraram campo para florescer e se impor.

No momento – que acreditamos próximo – em que a maravilhosa tecnologia da informação erigir o BEM como notícia, substituindo a esdrúxula situação presente em que o MAL é a notícia, o processo de aperfeiçoamento da sociedade dará um salto quântico, os ciclos de mudança na sociedade ocorrerão em intervalos muito mais curtos do que os verificados no passado e as forças do bem latentes serão despertadas.

Empresas e códigos em face da Grande Transição

Estamos convictos de que estamos assistindo à maior transição já ocorrida na história da civilização, e ela acontece a partir de uma sociedade quase totalmente guiada por princípios econômicos, típica do século XX, em direção a uma sociedade orientada por princípios éticos, que tendem a caracterizar os processos decisórios no século XXI.   Não estamos trabalhando com a hipótese da revogação pura e simples dos princípios econômicos, mas é para nós evidente que aqueles princípios, dos quais resultaram enormes desperdícios de recursos, agressões constantes e violentas contra a natureza, ou absurda concentração de renda e riqueza, serão reavaliados à luz dos interesses da maioria e das prioridades estabelecidas pela própria sociedade, agora muito mais esclarecida a respeito de sua realidade pela globalização da informação.  Seria ingênuo imaginar que uma transição dessa estatura pudesse realizar-se sem resistências ou turbulências e em curto prazo. Não esquecer, porém,  que os trabalhos de demolição costumam anteceder obras novas e, também significativo, que nessa caminhada o que importa fundamentalmente é a direção, não a velocidade.

Nesse novo quadro, a finalidade da empresa, como entidade econômica, já foi definida como “criar valor para o acionista” (M. Friedman); alguns anos depois, como “criar um cliente” (P. Drucker); mais recentemente, em nossos dias, como “ajudar a criar um mundo sem pobreza” (M. Yunus).  E não se trata de uma questão de puro otimismo ou de fantasia:  o maior respeito aos direitos humanos, a severidade das punições por atos danosos aos interesses da coletividade, o crescimento exponencial do número de governos democráticos no mundo (com todos os seus defeitos …), a intensa difusão das práticas de autorregulação, em paralelo com o endurecimento das disposições legais, a crescente independência dos tribunais, a ampliação e aperfeiçoamento tecnológico dos órgãos de controle, são realidades com as quais nos defrontamos em nosso dia-a-dia e que não comportam outra interpretação senão a de que a tão temida quanto alardeada corrupção entrou para o rol das “espécies em extinção”, e não poderia ser outro o destino de uma atividade que depende totalmente  da existência de três fatores: sigilo completo, cumplicidade absoluta e garantia de impunidade.   Estão aí o mensalão e o petrolão que não nos deixam mentir …

Neste novo cenário, os códigos de conduta continuarão a ser a ponte entre a ética e as organizações, particularmente as empresariais, destacando-se, entre as melhores práticas de governança, como aquela de maior convergência e mais rápido retorno.

Os bons códigos de conduta

Em mais uma iniciativa pioneira, o IBGC vem promovendo, há 5 anos, um curso sobre “fundamentos éticos e técnicas de elaboração de códigos de conduta”. Como etapa conclusiva desse curso, os participantes são convidados a responder às perguntas abaixo, com referência aos códigos das suas respectivas organizações:

ü  O código tem um modelo bem definido: código de princípios ou código de relacionamento?

ü  Ele se aplica igualmente a lideres e liderados, sem influência da hierarquia?

ü  Os princípios estão bem definidos e sua conversão em normas é bem clara?

ü  Mistura princípios éticos com princípios puramente disciplinares (para os quais a organização dispõe de outros veículos)?

ü  Define bem a responsabilidade dos líderes pelo bom ambiente de trabalho?

ü  Aborda com franqueza os objetivos econômicos da Organização?

ü  É construído em tom predominantemente afirmativo ou é uma série de vedações?

ü  Tem disposições que possam ser percebidas como manifestação de desconfiança nas pessoas?

ü  Como é tratada a questão da gestão do código?

Sugerimos que os nossos leitores levem essas diretrizes em conta na elaboração ou revisão de seus códigos. Será, sem dúvida, um bom começo …

 Artigo veiculado na publicação IBGC em Foco Especial 20 anos- N.75 Out/nov/dez 2015. páginas 6 a 11